Por Marcius Túlio
Eis que chegamos aos tempos do juízo final!
Durante minha atual e efêmera passagem por esse planeta azul, por absoluta bondade da Criação, ouço o termo JUÍZO FINAL. Sempre com conotação apocalíptica, aterrorizante, a expressão causa calafrios comuns, seja qual for a crença religiosa ou mesmo na ausência desta, trazendo interpretações as mais diversas.
Lembro-me com muita clareza de uma passagem ocorrida e vivenciada por mim no início dos anos 70, lá em Aimorés, MG, onde meu pai serviu como policial militar. Eram tempos difíceis, a considerar a tecnologia de comunicações, especialmente numa cidade onde a energia elétrica de forma ininterrupta acabara de “chegar”.
Boatos de que chegara o fim do mundo, o juízo final, estava marcado para um dia de outubro, e eu, uma criança de 8 anos de idade, recebi essa notícia na escola, logo fiquei perplexo, acabara de ganhar uma irmãzinha e já estava tudo acabado?
Foi necessária a intervenção sábia e oportuna do meu pai, já que não me atrevi a perguntá-lo sobre o assunto, por razões óbvias, mas ele percebeu minha inquietação e me acalmou com sua sabedoria quase salomônica. O mundo não acabou.
O tempo passou e em pleno século XXl, há poucos anos, portanto, essa notícia novamente correu o mundo, agora informatizado, a ponto de uma Delegada de Polícia “soltar” todos os presos de uma delegacia devido ao juízo final, fato noticiado pela mídia.
Meu pai não estava mais aqui, logo, tive que desvendar esse mistério por conta própria, embora com menos medo que da primeira vez. O mundo também não acabou.
Mas a expressão JUÍZO FINAL sempre povoou a imaginação humana, sobretudo em razão de algumas crenças, da criatividade ou da maldade que nos acompanha na jornada terrena, ao abordar esse tema, o tom da conversa sempre muda, ganhando contornos funestos e pessimistas. Fatores externos da percepção humana amplificam o contexto, muitas vezes com efeitos especiais, de forma que não o deixam desaparecer por completo.
É um fato.
Por mais divergentes que sejam os entendimentos sobre o juízo final, algumas congruências são percebidas e me pautarei pela mais otimista: o momento em que Deus, ou seja lá qual nome a crença dê, separará o joio do trigo, os bons dos maus, os justos dos injustos, a verdade da mentira e isso acontecerá, provavelmente diante de uma catástrofe de proporções planetárias, mas com a esperança de que o bem triunfará. Pelo menos é o que se espera nas previsões futurísticas.
Portanto, as pessoas devem ser boas e justas para escaparem, essa seria a tábua de salvação. Essa não é uma opinião nem sequer minha convicção ou mesmo crítica a qualquer crença, apenas retrato um acontecimento recorrente.
Ainda assim, com as idas e vindas das crenças populares, chegamos ao juízo final, pelo menos no Brasil. Agora possuímos um ser supremo que tem o poder de separar o joio do trigo, com onipresença e onipotência define o que é bom e o que é mau, decide o que é verdade e o que não é, pretende dissipar o que classifica como mentira e exterminar os maus de forma magnânima.
Como meu pai não está mais aqui para tirar-me essa dúvida cruel, me curvo a aceitar as definições defendidas por boa parte de eruditos expoentes da política e da mídia brasileiras, contra tudo e contra todos, acreditando que está em jogo a soberania nacional do Brasil.
Aqui nesse país maravilhoso, onde a honestidade é cartão de visitas, onde a seriedade e o compromisso com a verdade são preponderantes, é proibido dizer, difundir ou repercutir o que é definido previamente como mentira.
Sempre lembrando que a verdade é absoluta, mas sua percepção é relativa ou que a mentira é a verdade que não deu certo, estamos em tempos do JUÍZO FINAL, ainda que não com a conotação apocalíptica de outrora, mas com ares escravagistas, de submissão e com efeitos indefinidos.
A linha tênue que distingue a verdade da mentira deixou a seara do imaginário, do interpretativo, do criativo e do bom humor sem a devida “checagem” ou permissão, mas isso é bom, pois ainda bem que não temos censura no Brasil.
Paz e Luz.
Marcius Túlio e articulista do JC, analista político e Coronel da Polícia Militar de Minas Gerais