POR MARCIUS TÚLIO
De causar estranheza o fato de que até pouco tempo, provavelmente até 2018 aproximadamente, sempre que se falava no regime nazista, vivido na Alemanha nos anos 30 e 40 do século passado, a reação das pessoas era, de imediato, de asco, de repulsa para agora, em plena década de 20 do século atual, quase 100 anos após, o tema é defendido e até cultuado por pessoas que jamais imaginaríamos.
O conceito original do Estado Policial, cunhado na Prússia no século XVlll, trazia consigo conotação positivista pois se baseava no ideal de que a atuação do Estado era necessária e natural na busca de manter a moral e os bons costumes no seio das civilizações e que esse mesmo Estado promoveria o bem estar da população em todos os sentidos.
Já no século XlX, esse conceito começou a sofrer mutações que alteraram substancialmente a conotação positiva original. Inexoravelmente, os interesses da população confundiram-se com os interesses do Estado, o que, naturalmente, fez o fiel da balança pender para o lado mais forte, o Estado.
Com o poder coercitivo nas mãos, o Estado passou a controlar com mão de ferro as atividades, priorizando seus próprios interesses, em detrimento das chamadas dinâmicas das forças sociais.
Estabelecida a controvérsia, os conceitos de Estado Policial ganharam força, reacendendo regimes absolutistas que já haviam se tornado obsoletos. As consequências não tardaram muito a chegar, como nos ensina a História.
Aquele ideal de promover o bem-estar da população passou a ser o da garantia do regime adotado, passando a justificar suas ações pela finalidade que era a felicidade dos cidadãos, baseado no fundamento de que só o Estado absoluto poderia dispor dos meios para garantir essa felicidade, usando, inclusive a força, segundo seus indicadores.
Em resumo, assim se registraram os primórdios do chamado Estado Policial que, com o passar dos anos, se tornaram símbolo dos regimes totalitários e absolutistas, alguns dos quais resistem ao tempo.
Os regimes constitucionalistas que consagraram a chamada democracia obviamente hão de repudiar esses conceitos, bem como seus efeitos, para garantir o bem-estar de suas populações, dentre os quais, um dos pilares é a liberdade.
A História, entretanto, registra regimes híbridos, onde a interferência do Estado se faz necessária para conter disparates, comuns aos humanos, mas no limite da pacificação, o que justifica a existência do Estado Policial nas constituições democráticas, em caso de grave quebra da ordem constitucional.
A manutenção da moral, dos bons costumes, da segurança pública e da segurança jurídica não deve nem pode ser confundida com o Estado Policial, “onde a organização estatal fortemente baseada no controle da população (e, principalmente, de opositores e dissidentes) por meio da polícia política, das forças armadas e outros órgãos de controle ideológico e repressão política”, conforme alguns conceitos defendidos na nossa História contemporânea e atual.
Enquanto vigente, o Estado Policial vai se tornando cada vez mais um Estado Policialesco, para onde convergem todas as atividades de uma nação, desde manifestações artísticas a delações ideológicas e tendenciosas entre pais e filhos, entre irmãos, amigos e até cônjuges.
A partir daí, por medo ou comodismo ou conveniência, os cidadãos garantem forma ao regime, fortalecendo seus instintos bestiais e consolidando seus efeitos passivamente em troca de picanha vegetal sabor abóbora e se deliciando com discursos delirantes e piadas picantes.
É notável, por derradeiro, que o pacato e simplório estilo de vida que caracteriza a vassalagem torna a consolidação de uma ditadura mais real e mais aprazível aos olhos dos tiranos e máscara os regimes totalitários usando o mantra da democracia para entorpecer mentes menos avisadas ou desinformadas, sendo certo que esse sistema já adquiriu vida própria a ponto de exterminar tudo ou todos que perdem sua utilidade.
Paz e Luz.
Marcius Túlio é analista político e Coronel da Polícia Militar de Minas Gerais.