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Política pública fiscal e a reforma tributária – Parte 2

O colunista Jamir Calili prossegue o debate e a exposição de ideias acerca da reforma tributária
Legenda; Imagem ilustrativa reproduzida da Internet
segunda-feira, 18 setembro, 2023

Na semana passada dei início aqui ao debate sobre a reforma tributária e destaquei os aspectos mais controversos do nosso sistema. Foi um diagnóstico sobre a situação atual do nosso sistema baseado em evidências das ciências econômica, jurídica e social. Na coluna deste domingo pretendo abordar as principais propostas que a reforma busca implementar no sistema tributário. Vou abordar quatro propostas que podem ser consideradas o núcleo da reforma.

A primeira mudança refere-se à implementação do imposto sobre valor agregado que é a matriz de cinco impostos do sistema brasileiro: ICMS, IPI, PIS, COFINS e ISS. A ideia é aglutinar todos esses tributos em dois tributos: um IVA federal substituindo o IPI, PIS e COFINS, que daria origem à Contribuição sobre Bens e Serviços e um IVA dos Estados e dos Municípios que irá englobar o ICMS e ISS, dando origem ao Imposto sobre Bens e Serviços. Além disso, seria criado o Imposto Seletivo que incidiria sobre produtos específicos, com o objetivo de desestimular o consumo de alguns bens como cigarro, bebidas e produtos prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente, o que tem sido, também, chamado de imposto sobre o pecado.

Essa estrutura é mais complexa que a proposta original da PEC 45 que seria a existência de um único tributo. Porém, as complexidades desse modelo proposto são ainda muito menores do que o do modelo em vigor, o que gerará redução do chamado custo de conformidade, ou seja, o custo para administrar os tributos a serem pagos e geraria aumento da eficiência econômica. Essa proposta precisa vir com alíquotas que possam assegurar a neutralidade tributária, ou seja, que não exista tantas alíquotas e isenções que acabem orientando a concentração econômica ao invés da descentralização.

A segunda mudança seria uma grande inovação no sistema tributário brasileiro, mas um velho conhecido dos sistemas tributários americano e europeu, que é o cashback em substituição às isenções. Cashback é um sistema de devolução de impostos sobre o consumo que tem por foco famílias de baixa renda. Ao invés de aplicarmos um sistema de isenção geral que beneficia ricos e pobres sobre itens que consideramos necessários ou básicos, o sistema foca no perfil pessoal do consumidor, que terá direito à restituição de impostos conforme suas características individuais ou familiares. Isenções embora sejam bem-intencionadas são, geralmente, quando aplicadas ao consumo, geradoras de distorções na economia e acabam tendo efeito regressivo, ou seja, beneficiando quem menos precisam delas.

Além disso, isenções geram aumento de complexidade para empresas, uma vez que podem variar de acordo com municípios e estados. No sistema de cashback você reduz a complexidade e o custo de conformidade é transferido para aqueles que irão se apropriar diretamente do benefício. Além disso, o beneficiário vai receber diretamente o dinheiro devolvido, que poderá ser reutilizado no mercado em seu próprio benefício. Ademais, o cashback sempre será pago ao beneficiado. No sistema de isenção, a lei de oferta e procura pode gerar apropriação do benefício somente pelo empresário e não pelo consumidor em si. As famílias mais carentes precisarão de um sistema simples para receber o dinheiro de volta, mas o foco ficara restrito a elas e não aos ricos, o que ajudará a combater a desigualdade e a pobreza. Há outros benefícios do cashback em relação a isenção que não cabe falarmos aqui, mas este tem sido apontado como um sistema mais justo do que o modelo de isenção que temos.

Outra mudança que a reforma gerará será a instituição do IPVA do luxo, ou seja, o imposto sobre veículos aéreos e náuticos, os quais hoje não pagam nenhum tributo. O sistema atual aplica o IPVA somente aos veículos automotores. Portanto, alguém que tem um carro 1.0 paga mais tributos do que quem tem avião e iate.

Outra proposta que está em jogo é a unificação de alíquotas. Muitas pessoas têm falado que a reforma irá aumentar a alíquota para 25%. Não é verdade. A proposta na verdade equilibra a alíquota para todos os setores, sem setores privilegiados ou escolhidos e unifica a alíquota. Hoje os consumidores já pagam mais de 25% de alíquota sobre o consumo quanto tomada a carga tributária como um todo. Ou seja, a reforma pretende dar maior transparência de forma que o pagador de imposto não só saberá que paga, mas saberá quanto paga, e poderá se insurgir com mais qualidade contra políticas desastradas ou de má qualidade.

Essa coluna não permite que a gente avance nas críticas ou pontos que devemos observar, por falta de espaço. Mas não pretendo deixar meu leitor sem essas informações, por isso nos dois próximos domingos ainda vamos continuar abordando sobre o tema, e falar um pouco mais das propostas, críticas e pontos de destaques que demandam nossa atenção.

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