A gestão, implementação e fiscalização das políticas ambientais no Estado correm sério risco de ficar paralisadas. O anúncio foi feito por trabalhadores do Sistema Estadual de Meio Ambiente (Sisema), reunidos em audiência pública da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) nesta quinta-feira (29/5/25).
A reunião teve início na parte da manhã, porém precisou ser suspensa devido aos trabalhos de votação do Plenário da ALMG. Na parte da tarde, a audiência foi retomada.
Confira o resultado e assista aos vídeos da reunião:
Representados pelo Sindicato dos Servidores Estaduais do Meio Ambiente e da Arsae (Sindsema), os trabalhadores declararam a possibilidade de uma greve, caso suas reivindicações não sejam atendidas pelo Governo de Minas até julho. Os servidores demandam plano de carreira, recomposição salarial e novos concursos públicos para a área ambiental.
“Não tem como defender meio ambiente e território sem defender os servidores que trabalham nele”, pontuou, logo no início da discussão, a deputada Beatriz Cerqueira (PT), que solicitou a audiência pública.
A parlamentar argumentou que um sistema de meio ambiente fortalecido só é possível pelas mãos de servidores efetivos atuando de forma independente e autônoma. Ela mencionou a gravidade do caso da Serra do Curral, cujo parecer para licenciamento foi emitido por uma consultoria contratada. “Um parecer dando ok para uma mineradora criminosa continuar minerando”, opinou.
A defesa dos servidores foi reforçada pela deputada Bella Gonçalves (Psol), para quem o momento é de ataque extremo aos defensores do meio ambiente. A deputada exemplificou com o episódio de constrangimento sofrido pela ministra Marina Silva durante reunião no Senado esta semana, amplamente noticiado pela imprensa.
Bella Gonçalves lembrou ainda que o Programa de Pleno Pagamento das Dívidas dos Estados (Propag), ao qual Minas Gerais aderiu, prevê como contrapartida o investimento de recursos em ações de convivência com a crise climática no Estado. Para a parlamentar, o fortalecimento do Sisema deveria ser encarado como estratégico nesse contexto.
Salários baixos e carreira estagnada
A situação de desvalorização dos servidores foi apresentada na audiência pública pelo presidente do Sindsema. De acordo com Wallace Silva, a defasagem salarial da categoria em relação à inflação chega a 85%, após 11 anos sem recomposição. O sindicalista conta que, em 2012, o salário inicial da carreira de nível superior era de 4 salários-mínimos, hoje é de apenas 2.

Wallace Silva relatou que trabalhadores responsáveis por serviços como plantação de mudas e combate a incêndios ganham menos que o salário mínimo. Foto: Alexandre Netto ALMG
Um número de 163 auxiliares recebem menos que um salário-mínimo. “Um dos piores salários do País. Uma vergonha, um escárnio, além de inconstitucional”, afirmou Wallace Silva. Esses trabalhadores, segundo o dirigente sindical, são aqueles que exercem as atividades mais penosas, como a plantação de mudas sob o sol e o combate a incêndios.
Em relação ao plano de carreira, um acordo do governo com os servidores, homologado pela justiça em 2016, estabeleceu que ele fosse reestruturado. Porém, a determinação não foi cumprida pelo Executivo.
Necessidade de novos concursos
Outra questão apontada é o quadro reduzido de pessoal. Atualmente, todo o funcionalismo do Sisema é composto de cerca de 1.200 servidores efetivos. A quantidade era o dobro em 2016. Sem concurso desde 2012, muitos trabalhadores aposentaram ou migraram para a iniciativa privada desde então, deixando um grande vácuo.
“Temos regionais que atendem cerca de 70 municípios com 5 fiscais de meio ambiente para cuidar de todo território”, exemplificou Wallace Silva. Ele lembrou também que, apesar do número reduzido de fiscais, a Lei Mar de Lama Nunca Mais trouxe nova atribuição a esses servidores, o de fiscalizar barragens.
No mesmo tema, o vice-presidente do Sindsema, Cristiano Avelar, pontuou que o desmonte da área ocorre ao mesmo tempo em que o Estado ainda lida com as consequências dos maiores crimes ambientais do mundo neste século, referindo-se ao rompimento das barragens em Mariana e Brumadinho, nos anos de 2015 e 2019, respectivamente.
“Desde o crime da Samarco, o que se vê nos órgãos ambientais é o esvaziamento e a desidratação dos serviços. A ocorrência desses crimes deveria gerar um incremento da atividade fiscalizatória e regulatória. O efeito foi o contrário.”
Cristiano Avelar /Vice-presidente do Sindsema
Vários participantes da audiência relataram também situações de assédio moral e problemas no fornecimento de diárias para viagem para o trabalho em campo.
Greve é anunciada
Durante a audiência, o presidente do Sindsema comunicou aos representantes do governo que a categoria prepara uma greve. “Será a maior greve do sistema de meio ambiente de Minas Gerais”, anunciou Wallace Silva.
O sindicalista ressaltou que a paralisação trará impacto direto em atividades essenciais à economia do Estado, como a indústria e o agronegócio, uma vez que essas áreas dependem da fiscalização e licenciamentos do Sisema.
Wallace afirmou que a decisão por um movimento de greve é resultado de uma negociação que se arrasta há mais de sete anos sem avanços. Ele deu o prazo de até final de julho para que o Executivo apresente algum indício de aceitação das demandas da categoria. Caso contrário, a greve será deflagrada.
Responsabilidade fiscal impede mudanças, afirma Executivo
A superintendente central de Política de Recursos Humanos da Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão (Seplag), Maria Aparecida Muniz Jorge, reconheceu que existem distorções entre as 155 carreiras que fazem parte do quadro do Estado. Ela afirmou, contudo, que limitações do ponto de vista de responsabilidade fiscal impedem que essas distorções possam ser completamente solucionadas.
Em relação ao acordo de 2016 sobre o plano de carreira, a superintendente comunicou que em 2023 foi composto um grupo de trabalho que atualizou o cálculo dos impactos financeiros da proposta. Porém, a própria decisão judicial condiciona para cumprimento do acordo que o Estado esteja fora das vedações da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), o que não tem ocorrido.
A trava da LRF também veda que novos concursos sejam feitos para o sistema de meio ambiente, uma vez que não é considerada área essencial pela legislação, justificou a superintendente.
Maria Aparecida Muniz se comprometeu a encaminhar internamente discussões referentes a algumas demandas colocadas na audiência, como pagamento de um adicional de insalubridade para alguns cargos e a possibilidade de promoção por escolaridade adicional. Outras questões que não são de competência da Seplag serão compartilhadas com outras secretarias.
O superintendente de Gestão e Desenvolvimento de Pessoas da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad), Renato Alves Pereira, reafirmou o posicionamento da Seplag de que a LRF deixaria o governo de mãos atadas.
Renato afirmou que melhorias foram feitas na infraestrutura do sistema, o que se reflete também em melhores condições de trabalho. “Foram investidos quase 140 milhões na renovação da frota, compra de equipamentos, reforma de unidades regionais, modernização do parque computacional, entre outros”, disse.
Com informações do site oficial da Assembleia Legislativa de Minas Gerais








Trabalhadores denunciaram 11 anos sem recomposição salarial, estagnação na carreira e situações de assédio moral. Foto: Alexandre Netto ALMG