Autonomia, financiamento sustentável e capilaridade são os principais valores a serem defendidos para a construção de uma ciência capaz de contribuir para a democracia, de acordo com participantes de audiência pública desta quinta-feira (18/4/24). A reunião foi realizada pela Comissão de Educação, Ciência e Tecnologia da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).
O objetivo do encontro foi discutir o tema “Ciência e Democracia” com vistas a contribuir para os debates da 5ª Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação. O representante do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, Wadson Ribeiro, lembrou que as conferências deixaram de ser realizadas há quinze anos e sua retomada é, em si, uma vitória. Para ele, escutar a sociedade é essencial para avançar em qualquer campo.
A 5º Conferência, a ser realizada nos dias 4 e 6 de junho, em Brasília (DF), e terá como tema “Ciência, tecnologia e inovação para um Brasil justo, sustentável e desenvolvido”.
Além de salientar a importância do encontro para a elaboração dos programas e planos da Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (ENCTI) 2024-2030, Wadson Ribeiro destacou ações de incentivo que tem sido adotadas pelo governo federal para pesquisas.
Uma das conquistas citadas pelo convidado foi o descontingenciamento, em 2023, do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT). Segundo ele, no último ano foram executados R$ 10 bi do fundo e atualmente estão abertas 11 chamadas públicas para financiamento de projetos de tecnologia e inovação. Ele também citou a redução da taxa de juros para empresas privadas que investem em inovação.
Uma das preocupações do governo federal, de acordo com Wadson Ribeiro, é a constante redução da participação da indústria no PIB brasileiro nos últimos anos. Para ele, sem reverter tal quadro, é impossível avançar em direção a um maior protagonismo no cenário mundial. Os projetos do governo federal estariam voltados para a construção de uma indústria sustentável, ligada à transformação digital e à baixa emissão de carbono.
"O debate científico e tecnológico tem a ver com um projeto de país. Sem investimentos em ciência e inovação, é impossível um país desenvolvido e soberano". Wadson Ribeiro (representante do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação
Clélio Diniz, ex-reitor da UFMG e ex-ministro de Ciência e Tecnologia, afirmou que a discussão sobre a ciência e a tecnologia não pode se desvencilhar da sua “matriz política”, em especial na observação do cenário geopolítico. Para ele, o mundo vive atualmente uma das mais aceleradas corridas científicas da História e uma das consequências tem sido a ascenção da Ásia e o relativo declínio do Ocidente.
É preciso, então, melhorar a inserção do Brasil nesse cenário geopolítico. Clélio destacou que enquanto o Brasil investe menos de 1% do PIB em ciência e tecnologia, alguns países já investem mais de 4%. Ele destacou também que não se pode melhorar o avanço científico e tecnológico sem investimentos em educação básica de qualidade.
Autonomia e capilaridade são essenciais para a pesquisa e inovação
O potencial de Minas Gerais para contribuir com o avanço tecnológico e científico do Brasil foi lembrado pela reitora da UFMG, Sandra Goulart.
Ela destacou o grande número de institutos e universidades federais no território mineiro, além de duas universidades estaduais e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig).
Em termos de propostas para a 5º Conferência, ela levantou a importância de se garantir a autonomia universitária.
É a autonomia, segundo Sandra Goulart, que garante a diversidade das formas de pensamento, a pesquisa isenta e o florescimento de diversas formas de conhecimento. Essa autonomia, segundo ela, é constantemente atacada e é preciso barrar os retrocessos.
"Só ciência independente contribui para o bem comum e para a democracia" Sandra Goulart (Reitora da UFMG)
Como exemplo, Sandra Goulart chamou atenção da urgência em se defender as agências de fomento, como a Fapemig, que teve alterações estatutárias recentes, realizadas pelo governador Romeu Zema (Novo) e criticadas por reduzir a autonomia do órgão.
Para a reitora, é preciso que as universidades estejam atentas às demandas sociais e possam trabalhá-las de forma transdisciplinar. Como exemplo, contou que a UFMG está estudando maneiras de usar Inteligência Artificial dentro da instituição. Para tanto, é preciso a participação de pesquisadores da área de tecnologia, mas também das humanidades, que vão estudar questões éticas e políticas envolvidas no uso dessas ferramentas.
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Outro ponto citado como essencial para constar nos projetos a serem discutidos na 5º Conferência é a capilaridade. Rafael Teixeira, reitor do Instituto Federal de Minas Gerais (IFMG), disse que, apesar do grande número de municípios mineiros, atualmente há um IF para cada três cidades. Ele demandou que tal capilaridade seja valorizada e incentivada.
Para o convidado, é preciso pensar em estratégias para incentivar pesquisa e extensão nos IFs, de forma a levar a ciência para as cidades do interior e envolver alunos do Ensino Médio nas atividades com vistas a iniciar a formação de novos cientistas. Para ele, é preciso pensar em bolsas de mestrado e doutorado para os institutos e adaptar a carga horária dos professores, para eles se dedicarem também à pesquisa e à extensão.
A deputada Lohanna (PV) concordou com o convidado e destacou o impacto de ações realizadas pelo governo federal em Divinópolis, apresentando as linhas de incentivo e financiamento para pesquisadores e empresas locais. Ela lembrou que os incentivos podem levar desenvolvimento a toda a região.
Novos pesquisadores reivindicam melhores condições
O presidente da Associação de pós-graduandos da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes), George Fonseca, comemorou o reajuste às bolsas de mestrado e doutorado, concedido em 2023 depois de dez anos de congelamento. Defendeu, porém, uma estratégia de reajuste anual das bolsas de acordo, pelo menos, com os índices econômicos de inflação.
Outra demanda apresentada por ele foi em relação aos direitos previdenciários dos pós-graduandos. Ele lembrou que as pesquisas muitas vezes são incompatíveis com outras atividades no mercado de trabalho e que elas são, em si, atividades laborais. Precisam, portanto, ser reconhecidas enquanto tais para garantir a sobrevivência dos novos pesquisadores e sua permanência no campo científico.
Outra proposta apresentada para os pós-graduandos e pós-graduados foi feita pela presidenta da Academia Brasileira de Ciências, Helena Bonciani Nader.
Ela indicou que, se são oferecidos incentivos financeiros às empresas para investimentos em ciência, tecnologia e inovação, uma das contrapartidas deve ser a contratação de mestres e doutores. Ela defende que o conhecimento desses profissionais seja incorporado também no mercado privado.
O deputado Leleco Pimentel (PT), por sua vez, disse que é preciso também formar pessoas com vistas à discussão de políticas públicas voltadas para educação, pesquisa e inovação.
Com informações do site oficial da Assembleia Legislativa de Minas Gerais