Embora já tenham avançado na conquista e consolidação de direitos, as pessoas com autismo ainda enfrentam dificuldades de acesso às políticas públicas, para garantir o cumprimento deles.
Em síntese, esse foi o consenso entre participantes de audiência pública da Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa com Deficiência da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), realizada nesta quinta-feira (4/4/24).
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Nem o governo federal, nem o governo estadual escaparam das reivindicações apresentadas durante a reunião, cuja finalidade foi debater os direitos da população com transtorno do espectro autista (TEA).
A advogada Daniele Avelar, especializada em Direito das Pessoas com Deficiência, priorizou duas demandas.
Autista e mãe de autista, ela fez um apelo ao governador Romeu Zema para que solucione o problema da falta de professores de apoio, o que mantém diversos alunos autistas fora da escola em Minas Gerais.
Para o governo Lula, a advogada fez um apelo mais amplo: a homologação, pelo Ministério da Educação, do Parecer 50, do Conselho Nacional da Educação.
De forma geral, o parecer determina a matrícula sem discriminação por deficiência e a inclusão plena dos estudantes com transtorno do espectro autista (TEA) em todas as atividades escolares, com as devidas adaptações necessárias.
Apesar das reivindicações, Daniele Avelar ressaltou os avanços nos últimos anos. “Até 1943, o autismo estava dentro do diagnóstico de esquizofrenia. Na década de 80, se nós tivéssemos recebido o diagnóstico de autista, nós teríamos sido retirados da escola", disse.
"Hoje ouvimos que o autismo virou moda, que está saindo autista de todo lugar. As pessoas autistas sempre existiram, o que acontece é que elas estavam invisibilizadas.” Daniele Avelar (Advogada especializada em Direito das Pessoas com Deficiência)
Ana Lúcia de Oliveira, diretora Estadual de Políticas para Pessoas com Deficiência do Estado, da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social (Sedese), citou, como um avanço, a Carteira de Identificação da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista (Ciptea).
O documento contém informações de identificação da pessoa com TEA, contato de emergência, dados de seu representante legal ou cuidador.
A carteira também visa garantir a prioridade no atendimento e no acesso aos serviços públicos e privados. Segundo Ana Lúcia, já foram emitidas mais de 22 mil carteiras, em 727 municípios mineiros.
Presidente da Associação Pró-Autistas de São João del-Rei (Aspas), Daniele Muffato citou o caso do seu próprio filho, Pedro, para explicar a necessidade de um novo modelo que permita às pessoas com TEA desenvolver seu potencial.
Ela explicou que o adolescente, hoje no ensino médio, construiu um tour virtual no ambiente do jogo Minecraft, que mostra edifícios históricos de São João del Rei. “Ele tem potencial mas ele não escreve a redação, como é que ele vai entrar na faculdade?”, questionou.
TEA não é sinônimo de incapacidade
A falta de informação é um dos fatores que dificultam o acesso de pessoas com TEA e seus familiares a serviços e direitos já previstos.
Procurador do Estado do Rio Grande do Sul e coordenador do projeto Montando um Time, o mineiro Gustavo Castro Lavorato da Rocha lamenta que o Brasil não tem dados sobre o número de pessoas com o transtorno.
Em Minas, não há centros especializados para atendimento a pessoas autistas e pouco mais de 180 serviços estão disponíveis para todos os 853 municípios e os mais de 20 milhões de habitantes.
Pai de duas crianças e casado com uma médica cirurgiã autista, Gustavo Lavorato sustenta que o transtorno não é sinônimo de incapacidade.
Ele defende políticas públicas coordenadas de saúde, educação e trabalho para a inclusão dessas pessoas e para prevenir a necessidade de assistência social futura para os excluídos.
Mãe atípica (quem tem filho com TEA), a deputada Ana Paula Siqueira (Rede) afirma que a desinformação dificulta o acesso aos direitos e impõe preconceito e sofrimento para as famílias. “Crianças não estão recebendo o necessário atendimento nas escolas”, exemplifica.
Ela também apontou a necessidade de políticas de apoio aqueles que cuidam das pessoas com TEA, principalmente mães que, muitas vezes, precisam abandonar o trabalho e enfrentam dificuldades para alcançar serviços públicos. “Há diferença entre ter direito e ter acesso”, concluiu.
O deputado federal Reginaldo Lopes (PT/MG) defendeu que o trabalho do cuidador seja remunerado e, sobretudo, tenha garantido os direitos previdenciários. Segundo ele, são aproximadamente 1,1 milhão de pessoas que cuidam, mais de 95% mulheres.
Políticas de inclusão são demandadas
Necessidade de ampliar investimentos e melhorar serviços foram demandas apresentadas em consenso. Foto: Guilherme Dardanhan/ALMG
Reforço no orçamento público e ampliação das políticas direcionadas às pessoas com TEA foram demandas apontadas por todos os participantes da audiência pública.
Autor do requerimento para realização da reunião, o deputado Cristiano Silveira (PT), que também é pai de uma criança autista, disse que é necessário garantir qualificação contínua dos profissionais que atendem esse público e organizar o sistema, para que a inclusão aconteça de forma efetiva.
Maria Clara Marra (PSDB), que também tem parentes autistas, ressalta que a proporção atual é de que haja uma pessoa com TEA a cada 36 nascidas. A projeção é que isso pode chegar a uma a cada 15. “Estamos caminhando para um mundo autista. Eles precisam ser inseridos”, alerta.
O presidente da comissão, Dr. Maurício (Novo), citou a necessidade de equipes multidisciplinares nas escolas, com psicopedagogos, fonoaudiólogos e fisioterapeutas, para um melhor atendimento dos alunos com TEA.
Com informações do site oficial da Assembleia Legislativa de Minas Gerais