Com exceção da representante do Instituto Estadual de Florestas, todos os presentes da reunião da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável nesta sexta-feira (12/7/24) se posicionaram contra a concessão da gestão do Parque Fernão Dias.
Situada entre Betim e Contagem, na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), a Área de Proteção Ambiental (APA) Estadual Parque Fernão Dias, foi tema de audiência na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).
Atualmente, a gestão do parque é compartilhada entre a Prefeitura de Contagem e o Governo do Estado, por meio desse órgão estadual.
Mas na última semana, o governo divulgou proposta de concessão dos serviços de lazer e entretenimento da unidade de conservação, prevendo um investimento de R$ 13 milhões, em um contrato de 30 anos, por parte do ganhador da concorrência.
A deputada Bella Gonçalves, que solicitou a reunião, assim como integrantes de entidades ambientais e sociais de Contagem manifestaram-se a favor do atual sistema de gestão, compartilhado entre Prefeitura de Contagem e Governo de Minas.
E fizeram questionamentos à coordenadora do Núcleo de Projetos Especiais do IEF, Cecília Vilhena, a qual defendeu o modelo de concessão à iniciativa privada.
Ainda na reunião, o representante da Secretaria de Meio Ambiente desse município reiterou o pedido já feito pela prefeitura de municipalização do parque.
Consulte o resultado e assista ao vídeo completo da reunião.
Geraldo Abreu, subsecretário de Controle Ambiental da Secretaria de Meio Ambiente de Contagem, destacou que a APA Fernão Dias tem 98 hectares e foi criada em 2016 por lei estadual, oriunda de projeto da então deputada Marília Campos, atual prefeita. Lembrou que quando a prefeitura assumiu o parque, a unidade estava em condições precárias.
“Fizemos investimentos expressivos, o que proporcionou a revitalização de equipamentos para que pudessem ser utilizados pela população; hoje, temos visitas até de outros estados e países”, destacou. Lembrou que a prefeita, em junho deste ano, enviou ofício à Secretaria de Estado de Meio Ambiente, manifestando interesse em municipalizar o parque.
“Várias questões da modelagem da concessão, o município já tinha começado e, por isso, tivemos interesse em passar para a gestão plena de Contagem”, relatou. Geraldo Abreu disse esperar que a titular da Semad, Marília Carvalho, chame a prefeita para conversar e que, em vez de passar a concessão a um terceiro, transfira para o município.
Entidades
Wesley Duarte, do Movimento Todos por Contagem, registrou que o parque ficou fechado por mais de dez anos, devido ao total abandono pelos municípios envolvidos e pelo Estado.
Só em 2021, foi firmado acordo de gestão da unidade pelo Estado e pela Prefeitura de Contagem, a qual investiu R$ 2,6 milhões, levando a uma visitação de mais de 200 mil pessoas. Diante dos números, ele afirmou que nada justifica a concessão, ainda mais por 30 anos, renováveis por outros 30.
Vanderleia Reis, da Frente Popular de Contagem, manifestou preocupação com a ausência na reunião de representantes da Prefeitura de Betim.
Também questionou a consulta pública realizada pelo Governo do Estado sobre a proposta de concessão do Parque Fernão Dias.
Segundo ela, a consulta deveria acontecer no próprio parque, e não em espaços privilegiados de poder, como universidades, e durante o dia, quando os trabalhadores não podem participar.
Cristina de Oliveira, ativista do Movimento SOS Vargem das Flores, avaliou que a consulta é “para inglês ver”, já que em outras iniciativas de concessão, o governo de Minas agiu da mesma forma, como no caso do Rodoanel e de audiências envolvendo a mineração. Moradora de área rural de Contagem, disse que o contato com as árvores é que leva as pessoas ao parque.
“Vocês estão querendo criar necessidades para os frequentadores, mas eles já têm boa aceitação do que existe hoje”, afirmou, dirigindo-se à representante do IEF. Acrescentou que, neste momento de crise climática, os parques são ótimos para enfrentar as ondas de calor. E que a “privatização do parque vai inibir o acesso dos mais pobres ao local, escancarando a desigualdade social”.
Severino Iabá, do Boi Rosado Ambiental e Movimento Lambuzadas, lembrou que, em audiência sobre a concessão realizada na PUC de Contagem, ficou clara a rejeição da população ao projeto de concessão. E mostrou-se decepcionado por avaliar que a consulta não deve respeitar a vontade popular. “Que democracia é esta?”, questionou.
Valdir Pontes, da Comissão Nascentes Imperiais, suspeitou que a empresa vencedora terá direito de negociar créditos de carbono, recebendo milhões por gerir o parque. E divulgou que a empresa norte-americana Tesla recebeu em 2023 R$ 1,8 bilhão de créditos de carbono.
A vereadora de Contagem Moara Saboia ressaltou que a Prefeitura de Contagem gasta R$ 800 mil por ano com a manutenção da unidade.
E já conta com um modelo de gestão, no qual entram parcerias público-privadas na realização de obras, e recursos de emendas parlamentares.
Questionando a consulta feita pelo Estado, contrapôs a enquete feita pela Frente Popular de Contagem, a qual mostrou que mais de 90% dos entrevistados são contra a concessão.
Programa estadual já promoveu cinco concessões de parques
A coordenadora do Núcleo de Projetos Especiais do IEF, Cecília Vilhena, também julgou que seria importante a participação na audiência de representante da Prefeitura de Betim, que conta com 90% da área do Parque Fernão Dias. Sobre a consulta pública, divulgou que o prazo, que venceria em breve, foi adiado até 19 de agosto.
Sobre a proposta para a unidade, lembrou que ela se insere no Programa de Concessão de Parques Estaduais, lançado em 2019, que já conseguiu realizar cinco concessões.
Enfatizou a diferença entre privatização e concessão, afirmando que na primeira, acontece a venda do ativo.
Já na concessão, uma empresa assume alguns serviços por tempo determinado, respeitando normas e contratos, e ao fim do período, tudo é revertido para o Estado.
Disse ainda que o programa de concessão de parque tem como premissa a conservação ambiental.
“Avaliamos quais as áreas passíveis de investimentos privados e o Estado mantém sua atribuição de garantir preservação, combatendo incêndios, promovendo a educação ambiental, atendendo à pesquisa científica, entre outras funções”, ressaltou. Cabe ao governo ainda o monitoramento e a fiscalização do cumprimento das regras do contrato. Na outra ponta, continuou, a prestação de serviços a usuários, como de alimentação, comércio, vai para um parceiro privado.
Além disso, continuou, o parceiro assume o compromisso de realizar investimentos a curto, médio e longo prazos e de fazer manutenções durante toda a vigência do contrato, compartilhando com o órgão concedente parte das receitas obtidas. No caso presente, a partir do segundo ano da concessão, 3% da receita bruta auferidos pela empresa retornam para o Estado, na forma de benefícios sociais e ambientais.
A gestora lembrou que o Parque Fernão Dias, apesar de contar com boa visitação, conta com subutilização do espaço, por precisar de melhorias. Ela adiantou que entre as premissas do contrato estão a entrada gratuita para todos, já que se trata de um parque urbano.
Ela citou intervenções a serem realizadas nos dois núcleos do parque. Em Contagem, estão previstas: reforma da portaria, do velódromo e da pista de bicicross; criação de Centro de Visitantes, construção de vestiários, entre outras.
Já em Betim, prevê-se a construção de pista de skate e de patins e de áreas de estacionamento, entre outras intervenções.
Serão gerados, segundo estimativas, mais de 600 empregos diretos e indiretos e uma arrecadação de R$ 3,4 milhões em impostos.
Estudos de impacto ambiental
A deputada Bella Gonçalves questionou porque o projeto de concessão não prevê estudos de impacto ambiental (EIA)e de impactos na vizinhança.
Cecília Vilhena respondeu que Não há nenhuma área no parque que gere impacto ambiental considerável.
“Queremos continuar propiciando sombra, ar puro, bolsões verdes para a população”, declarou ela, complementando que todas as intervenções previstas serão em áreas antropizadas (modificadas pelo ser humano)
Bella Gonçalves, em tréplica, afirmou quanto ao impacto à vizinhança que não há como o governo se esquivar: “o projeto deveria prever o impacto para a população local, que vai passar a pagar por coisas que utilizar no parque”. Sobre o impacto ambiental, lembrou que a justiça fechou um parque estadual em Caxambu (Sul), porque o Estado não realizou o EIA.
Ao final da reunião, a parlamentar anunciou que vai solicitar a retirada do Parque Fernão Dias do programa de concessões e a renovação do termo de cooperação entre a Prefeitura de Contagem e o IEF.
Disse ainda que levará as questões trazidas na reunião ao Ministério Público e que, se não houver diálogo entre os dois envolvidos, uma ação judicial pode cancelar o processo de licitação.
Com informações do site oficial da Assembleia Legislativa de Minas Gerais