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Atingidos por barragem em Brumadinho cobram continuidade de programa de renda

Sem reparação integral após seis anos da tragédia, moradores da Bacia do Paraopeba ainda correm o risco de ficar sem pagamento de auxílio emergencial.
Centenas de pessoas atingidas pelo rompimento da barragem acompanharam a audiência pública no Estado Democrático José Aparecido de Oliveira. Foto: Luiz Santana ALMG
sexta-feira, 14 março, 2025

Passados seis anos do desmoronamento da barragem da Vale na Mina Córrego do Feijão, em Brumadinho (Região Metropolitana de Belo Horizonte), atingidos pela tragédia não foram indenizados e ainda enfrentam a perspectiva de encerramento dos pagamentos do Programa de Transferência de Renda (PTR) em janeiro de 2026.

O PTR está previsto no acordo de reparação assinado em 2021 entre a Vale, o Governo de Minas Gerais e as instituições de justiça que acompanham a ação judicial referente ao desastre. Desde que foi instituído, sua gestão está sob responsabilidade da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

Nesta sexta-feira (14/3/25), centenas de pessoas atingidas se mobilizaram na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) para audiência realizada sobre o assunto na Comissão de Direitos Humanos, pedida pela deputada Beatriz Cerqueira (PT).

Consulte o resultado e assista ao vídeo completo da reunião

A audiência marcou o Dia Internacional de Luta contra as Barragens, pelos Rios, pela Água e pela Vida, celebrado neste 14 de março.

"O 14 de março é um dia de luta das vítimas dessas mineradoras criminosas que destroem nossas bacias, assassinam nosso povo e depois querem controlar a reparação do crime que elas mesmas cometem."

Beatriz Cerqueira
Dep. Beatriz Cerqueira

A parlamentar pediu ainda um minuto de silêncio "pela dor de todos os familiares e em memória das 272 jóias assassinadas pela Vale".

Na audiência, todos os convidados frisaram que o PTR é uma medida de mitigação, criada para auxiliar a sobrevivência dos impactados até a reparação integral dos danos e recebimento das indenizações. O valor praticado já foi de um salário mínimo e está em redução gradativa.

A partir deste mês, os adultos que moravam na chamada Zona Quente (área mais próxima do local do rompimento da barragem) passaram a receber 50% do salário mínimo e os adultos de fora dessa região passam a receber 25% do salário mínimo. Familiares de vítimas fatais, adolescentes e crianças não terão alterações no valor atual recebido.

"Como uma mitigação pode acabar antes da reparação?" foi o questionamento geral do Movimento dos Atingidos por Barragem (MAB), que também cobrou a continuidade do trabalho das Assessorias Técnicas Independentes (ATIs), diante da previsão de que elas sejam encerradas em dezembro deste ano. As ATIs atuam para a participação informada da população no processo de reparação.

Reparação caminha a passos lentos

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Segundo Guilherme Camponêz, a Vale não indenizou individualmente nem 10% da população atingida e não executou medidas de reparação socioambiental. Foto: Luiz Santana ALMG

Guilherme Camponêz, da Coordenação Estadual do MAB, expôs levantamento indicando que 49% dos impactados pelo ocorrido em Brumadinho passam até hoje por situação de insegurança alimentar, quadro que sem o alívio do PTR só tende a se agravar.

Conforme destacou, o fim do programa vai ocorrer mesmo com a reparação estando muito longe de se materializar. Segundo Guilherme Camponêz, a Vale não indenizou de forma individual nem 10% da população atingida, não executou medidas socioeconômicas das reparações coletivas e nem mesmo a reparação socioambiental, tendo limpado apenas 1% da área atingida.

A permancer nesse ritmo, estudos estimam um prazo de 720 anos para a recuperação da bacia do Rio Paraopeba, disse o representante do MAB.

"As águas e o solo continuam contaminados e sequer o estudo de risco à saúde humana ficou pronto. Será concluído quando já tivermos pessoas mortas por contaminantes?"

Guilherme Camponêz - Coordenação Estadual do Movimento dos Atingidos por Barragens

A deputada Bella Gonçalves (Psol), presidenta da Comissão de Direitos Humanos, compactuou da mesma avaliação. "A reparação ainda não chegou aos atingidos e os responsáveis ainda não responderam por seus crimes", lamentou.

Representante do povo indígena Aranã, João Luiz Moreira Índio afirmou que nem mesmo o auxílio financeiro chegou a todos que teriam o direito. "Qual o preço de uma vida, qual o preço de um rio, o preço de uma montanha? Até hoje o povo Aranã não conseguiu acesso ao PTR", frisou.

Valéria Carneiro, do Assentamento Pastorinhas em Brumadinho, lembrou do Dia Internacional da Mulher, 8 de março, para registrar que das 272 pessoas soterradas pela lama da barragem, 60 eram mulheres, duas delas grávidas.

Redução do valor do auxílio teria sido abrupta

Rogério Giannetti, da Rede de Atingidos da Região 3 da Bacia e do Movimento Paraopeba Participa, lembrou que a redução do valor do PTR já era prevista, porém de maneira gradual.

"Pelo acordo, o valor do PTR seria reduzido gradativamente, mas a forma como isso vem ocorrendo é um baque na economia local e no bolso de cada um que precisa desse auxílio para sobreviver."

Rogério Giannetti - Atingido pelo rompimento

Segundo Ranúzia Moreira de Lima Netta, da Gerência Geral do Eixo Reparação da Associação Estadual de Defesa Ambiental e Social (Aedas), as assessorias técnicas estimaram a necessidade de R$ 9 bilhões para mitigação emergencial, mas o acordo judicial de reparação disponibilizou para o PTR menos da metade, R$ 4,4 bilhões.

Segundo dados da FGV, quase 160 mil pessoas se cadastraram para receber o auxílio.

Carla Wstane de Souza Moreira, diretora do Instituto Guaicuy, pontuou que o programa e a reparação integral aos atingidos não devem ser vistos como um favor assistencial, mas como obrigação da Vale de executar e do governo de cobrar essa responsabilidade.

Parlamentares cobram definição sobre fim do programa

O deputado estadual Leleco Pimentel (PT) e os deputados federais Rogério Correia e Padre João (ambos do PT-MG) estiveram presentes na audiência e reforçaram o pedido por uma solução justa em relação ao PTR. Uma audiência na Câmara dos Deputados em Brasília também irá tratar do assunto.

A deputada Beatriz Cerqueira cobrou dos representantes do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) presentes na audiência um posicionamento sobre o fim do programa.

Em resposta, o promotor de justiça Leonardo Castro Maia informou que o MPMG tem a responsabilidade de acompanhar o cumprimento do acordo, mas não possui a atribuição de adotar novas medidas.

"O fim do programa não é uma deliberação ou uma decisão política discricionária. O fim do programa é o fim do recurso."

Leonardo Castro Maia - Promotor de justiça do Ministério Público de Minas Gerais

A promotora Shirley Machado de Oliveira, da Coordenadoria de Inclusão e Mobilização Social (Cimos) do MPMG, complementou: "O que nos cabe nesse momento é receber todas as informações ditas e registradas nessa audiencia para que a gente faça o diálogo interno e busque um encaminhamento".

Ao final, os representantes do MPMG se comprometeram a responder as questões trazidas na audiência em um prazo de 10 dias úteis.

A FGV e a Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão (Seplag), também presentes na audiência, se colocaram à disposição para contribuir com as discussões.

Com informações do site oficial da Assembleia Legislativa de Minas Gerais

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Fotos: Luiz Santana ALMG

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