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STF manda parar processos que discutem “pejotização” e vínculo de emprego: entenda o que isso significa

Leia a coluna desta semana da Dra. Hellen Louzada
Supremo Tribunal Federal. Foto: Reprodução da Internet
domingo, 20 abril, 2025

por Hellen Louzada

Nos últimos dias, uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) chamou atenção e tem gerado muitas dúvidas e preocupações entre trabalhadores e empresas. O ministro Gilmar Mendes determinou que todos os processos que tratam da chamada “pejotização” fossem suspensos em todo o Brasil. Mas, afinal, o que isso quer dizer?

O que é pejotização?

Pejotização é um nome que ficou popular para se referir a uma prática bastante comum no mercado de trabalho: a contratação de uma pessoa como se fosse uma empresa, ou seja, ela abre um CNPJ (vira “PJ” ou “MEI”) e passa a prestar serviços como se fosse uma prestadora, e não uma em- pregada.

Na prática, muitas pessoas são contratadas como PJ, mas trabalha como se fosse empregado: tem superior, horário fixo, recebe ordens, bate ponto, etc. Ou seja, está em uma relação de emprego, mas sem os direitos da CLT (como férias, 13º salário, FGTS, entre outros). Nesses casos, a Justiça do Trabalho muitas vezes reconhece que houve uma fraude contratual, porque o trabalhador deveria, sim, ter sido contratado com carteira assinada.

O que o STF decidiu?

No dia 14 de abril, o ministro Gilmar Mendes decidiu suspender todos os processos na Justiça do Trabalho que discutem esse tipo de situação ou similar — seja com PJ, autônomo, franqueado, representante comercial ou qualquer outra forma de contrato diferente da carteira assinada.

Ou seja: se o empregado entrou na Justiça pedindo para que seu contrato como PJ fosse reconhecido como um vínculo de emprego, o processo pode parar de andar até que o STF tome uma decisão final.

Essa suspensão vale para todos os processos em andamento e até para novas ações que forem ajuizadas. E não há prazo para quando os processos voltarão a andar.

Por que o STF fez isso?

Segundo o ministro Gilmar Mendes, a Justiça do Trabalho estaria desrespeitando decisões anteriores do próprio STF — especialmente uma de 2018, que disse que é permitido contratar trabalhadores por meio de terceirização, mesmo para atividades principais das empresas.

Além disso, o STF está recebendo um número muito grande de reclamações de empresas contra decisões da Justiça do Trabalho que reconhecem vínculo de emprego mesmo quando há contratos civis (como presta- ção de serviços, contratos de franquia etc.). Isso estaria sobrecarregando o Supremo.

Com isso, o STF resolveu assumir a discussão de forma definitiva e criou o chamado “Tema 1389”, que vai analisar três pontos principais:

· Se a Justiça do Trabalho pode julgar esses casos;

· Se é possível considerar ilegal um contrato feito como PJ, autônomo ou outro tipo civil/comercial;

· Quem deve provar que havia (ou não) vínculo de emprego: o traba- lhador ou a empresa?

Essa suspensão vale para todos os processos em andamento e até para novas ações que forem ajuizadas. E não há prazo para quando os processos voltarão a andar.

Essa suspensão afeta só os PJs?

Não. A suspensão também vale para quem foi contratado como au- tônomo, franqueado, representante comercial, ou por qualquer outro contrato que não seja o de celetista, desde que se esteja discutindo na Jus- tiça se houve fraude na contratação — ou seja, se na prática a pessoa era um empregado.

Isso abrange milhares de trabalhadores: motoboys, profissionais da saúde, vendedores, corretores, advogados associados, técnicos de TI, artis- tas e muitos outros.

E agora, como ficam os processos?

Todos os processos com essa discussão deverão ser suspensos auto- maticamente, independente do momento que esteja.

Se o juiz continuar com o processo, a empresa ou a parte interessa- da pode apresentar uma reclamação constitucional diretamente ao STF. Isso pode fazer com que o Supremo anule todos os atos do processo que acontecerem depois da suspensão — inclusive audiências e sentenças.

Por isso, tanto advogados de trabalhadores quanto de empresas es- tão com muita atenção nesse momento.

E os casos que o empregado não possui contrato assinado?

Muitos trabalhadores entram com processo apenas dizendo que tra- balhavam sem carteira assinada, não apresentam contrato, mas relatam a rotina e pedem o vínculo.

Parte dos especialistas entende que esses processos não deveriam ser suspensos, porque não há um contrato civil ou comercial para ser anulado. Outros pensam que só de existir a discussão sobre vínculo, já seria motivo para parar o processo. Para sanar a discussão, será necessário que o próprio STF esclareça melhor os limites da sua decisão.

O que pode mudar no futuro?

O julgamento do Tema 1389 ainda não tem data para acontecer. Pode levar meses ou até anos. Mas quando acontecer, o STF vai decidir sobre:

· Quem deve julgar esses casos (Justiça do Trabalho ou Justiça co- mum);

· Quem tem o dever de provar a relação de emprego (o trabalhador ou a empresa);

· Se é válida ou inválida a contratação por outros meios (PJ, autôno- mo, franqueado etc.), mesmo que na prática a pessoa trabalhasse como um empregado.

A depender da decisão, pode haver grande impacto no mercado de trabalho, com milhares de processos sendo retomados, modificados ou até encerrados.

Essa decisão do STF mostra como o tema do vínculo de emprego é sensível e afeta milhões de trabalhadores no país. Muitos brasileiros estão contratados de formas alternativas, mas exercem atividades típicas de um empregado comum.

Se você está passando por uma situação parecida ou conhece alguém que esteja, é importante buscar orientação com um advogado de confiança e acompanhar os desdobramentos dessa questão, que promete gerar muita discussão no meio jurídico e também na vida real das pessoas.

Hellen Louzada Tavares Eler - OAB/MG 192.400. Advogada especializada em direito do trabalho. Bacharel em Direito pela UFJF-GV, Pós Graduada em Direito do Trabalho, Previdenciário e Práticas e em Direito Empresarial e Trabalhista. Instagram: @hellenlouzada.adv

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