Por Marcius Túlio
Cheguei aos 61 anos de existência terrena, na presente versão. Na forma da Lei nº 10.741/2003 sou considerado idoso, certamente “amparado por ela.
Não importa os rótulos de “gagá”, “galo véio”, “coroa”, “veterano” e outros tantos mais que destinam a mim, o que importa, de verdade, é que me considero um vencedor por ter chegado até aqui, o que aprendi com meus erros e acertos e as experiências que tive durante esse curto período, a considerar a vida infinita do espírito.
Sou um vitorioso.
Dessa forma, é inevitável que me cause estranheza o fato de que minha data natalícia, que remonta no milênio passado, não seja suficiente para atestar minha condição de idoso.
O respeito pelos “mais velhos” me foi ensinado desde o berço, ainda que esse costume ficasse no rol dos ultrapassados, sendo necessária a votação de uma lei que reconhecesse os ensinamentos dos meus pais. Mas o que incomoda é que inadvertidamente, a tal lei trouxe alguns penduricalhos esdrúxulos.
A começar pela exigência de se catalogar em órgão oficial para se ter a certeza da condição amparada pela lei, não basta documentação exigida para minha sobrevivência. Uma espécie de coleira, onde passei a ser considerado mais uma cabeça, um número, logo, sou gado.
Dito isso, algumas sequelas causam espanto:
_O quê determina minha condição de idoso, minha data natalícia ou a marca definida pelo Estado?
_A tal lei está sendo respeitada ou é mais uma para constar na relação de boas intenções?
_As famosas filas indianas destinadas a idosos é de fato, benéfica ou apenas uma forma dissimulada para burlar a lei, já que fila exclusiva nunca determina prioridade?
_Em 08 de janeiro de 2023 a lei foi respeitada?
Não sou um entusiasta de leis que são criadas apenas para dar satisfação à sociedade ou para angariar simpatia popular, sem nenhuma aplicação prática.
Lado outro, o que quero realmente ressaltar, é o flagrante curral social em que fomos depositados, tendo apenas como um exemplo o engodo do Estatuto do Idoso.
Assim como nos campos de concentração nazistas ou nos gulacs soviéticos, fomos ordeira e passivamente conduzidos a trabalhos forçados ou a câmaras de gás, disfarçados de ações sociais, direitos trabalhistas remunerados e liberdades controversas, com números, invisíveis a olho nu, cravados em nosso dorso, com movimentos devidamente controlados pelos nossos incríveis dirigentes.
A envergadura que a idade me permite trouxe consigo algumas reflexões preocupantes que compartilho humildemente: será que, de fato, sabemos o que é uma democracia?
Somos parte integrante do Estado?
Somos uma nação politicamente organizada ou somos uma nação ordenadamente manipulada pela política?
Caso ainda estejamos no livre exercício das nossas faculdades mentais, é bom que busquemos essas respostas para nossa sobrevivência como nação, pelo menos naquela nação que nossos pais nos falavam com entusiasmo juvenil.
Com a capacidade cognitiva severamente inibida por potentes placebos e por manobras evasivas habilidosas e convincentes, mergulhamos nas águas turvas das incertezas, bem próximos da ignorância, para nos tornarmos “povo marcado, povo feliz”, como dizia o artista.
Paz e Luz.
Marcius Túlio é Coronel da Polícia Militar de Minas Gerais