por Jamir Calili
O desenvolvimento urbano no Brasil tem passado por transformações significativas ao longo das últimas décadas, marcadas por desafios históricos e a busca por soluções inovadoras.
Desde a rápida urbanização dos anos 1960, que trouxe crescimento desordenado e desigualdades, até os avanços recentes em políticas públicas e instrumentos de planejamento, as cidades brasileiras têm buscado se reinventar.
Hoje, diante de questões como mudanças climáticas, densidade populacional e demandas
por inclusão social, novos paradigmas emergem, colocando a sustentabilidade e o bem-estar coletivo no centro das discussões.
A década de 1960 marcou o início da urbanização acelerada no Brasil, caracterizada por um crescimento desordenado e concentrado em poucas regiões.
Na década de 1970, movimentos sociais começaram a se organizar em prol da reforma urbana, ganhando força durante a redemocratização nos anos 1980.
A Constituição Federal de 1988, em seus artigos 182 e 183, consolidou a agenda urbana como uma política pública essencial, garantindo o direito à cidade e à função social da propriedade.No entanto, foi apenas em 2001, com a criação do Estatuto da Cidade, que os municípios passaram a contar com instrumentos concretos para implementar políticas de planejamento urbano.
A criação do Ministério das Cidades, em 2003, representou um avanço significativo, integrando temas como habitação, saneamento e mobilidade urbana.
Hoje, além dessas questões, o desenvolvimento urbano precisa considerar desafios globais, como mudanças climáticas, transformação tecnológica e desindustrialização.
O Plano Diretor é o principal instrumento de planejamento municipal, devendo estar integrado a outras leis e políticas públicas. Sua elaboração exige uma leitura cuidadosa do território, considerando densidade populacional, acesso a serviços públicos e integração regional.
Essa análise, que funciona como um diagnóstico, é essencial para identificar problemas e potencialidades, além de orientar estratégias de transformação urbana sustentável. A participação da população é um elemento central nesse processo.
O Plano Diretor deve refletir não apenas aspectos técnicos, mas também os desejos e necessidades da comunidade.
Para isso, é fundamental envolver universidades, empresas e organizações da sociedade civil, criando uma visão pactuada sobre o futuro da cidade.
Ferramentas como o cadastro técnico multifinalitário e estudos demográficos são essenciais para embasar decisões.
Um dos conceitos que ganhou destaque nos últimos anos é o das "cidades compactas", que buscam otimizar o uso do espaço urbano, evitando a expansão descontrolada.
O Estatuto da Cidade exige justificativas técnicas para a ampliação do perímetro urbano, incentivando o uso eficiente do solo.
O zoneamento, por sua vez, deve considerar diferentes densidades e usos, como áreas residenciais, comerciais, industriais e de preservação ambiental.
O macrozoneamento, ferramenta essencial para definir áreas urbanas e rurais, deve ser complementado por leis específicas, como a do parcelamento do solo e a do uso e ocupação do solo, que definem parâmetros para construções e atividades.
As cidades enfrentam desafios crescentes relacionados às mudanças climáticas, como enchentes, deslizamentos e ilhas de calor.
Nesse contexto, as soluções baseadas na natureza ganham relevância, integrando elementos como parques lineares, jardins de chuva e telhados verdes ao planejamento urbano. Essas iniciativas não apenas melhoram a qualidade do ar e a biodiversidade, mas também aumentam a resiliência das cidades diante de eventos extremos.
O Zoneamento Ambiental Municipal (ZAM) surge como um instrumento importante para integrar questões ambientais ao planejamento urbano. Ele permite identificar áreas de risco, definir zonas de preservação e promover a recuperação de ecossistemas degradados.
A transformação digital é outro eixo central do desenvolvimento urbano contemporâneo. As tecnologias de informação e comunicação (TICs) oferecem oportunidades para melhorar a gestão pública, a mobilidade urbana e a qualidade de vida da população. O desenvolvimento urbano no século XXI exige uma abordagem multidimensional, que integre planejamento técnico, participação popular e compromissos globais, como os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).
As cidades brasileiras têm o desafio de superar desigualdades históricas, ao mesmo tempo, em que se preparam para os impactos das mudanças climáticas e da transformação digital.
Instrumentos como o Plano Diretor, o macrozoneamento e o ZAM são essenciais para orientar esse processo, mas sua eficácia depende da capacidade de envolver a população e garantir a implementação das políticas propostas.
Somente com uma visão compartilhada e comprometida será possível construir cidades que sejam, de fato, inclusivas, seguras, resilientes e sustentáveis.
O futuro das cidades depende não apenas de tecnologias e infraestrutura, mas também da capacidade de colocar as pessoas no centro do planejamento urbano.
Jamir Calili é vereador em Governador Valadares e professor da Universidade Federal de Juiz de Fora, Campus GV