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Parlamentino à Brasileira - capítulo ll - A Sobremesa

Marcius Túlio analisa a influência ou o legado maligno, que segundo ele foi deixado por verdadeiros abutres da nossa História
Toda a parafernália jurídica que enfeita o processo político eleitoral brasileiro é, oriunda da enviesada construção da “Constituição Cidadã”. Foto: Ilustração reproduzida da Internet
domingo, 9 junho, 2024

POR MARCIUS TÚLIO

Em sequência ao pitoresco roteiro da saga na culinária política brasileira, é forçosamente necessária a apresentação da sobremesa umbilicalmente ligada ao prato principal, igualmente indigesta e cancerígena.

Quando se fala em política no Brasil, as figuras fantasmagóricas que tanto assombraram o país em tempos não muito longínquos não podem ser desprezadas, nomes certamente deixarei para as conclusões individuais, exaltando-as como “raposas felpudas” ou carinhosamente “felpudas”.

A influência ou o legado maligno deixado por esses verdadeiros abutres da nossa História ainda trazem sequelas aparentemente incuráveis no seio do povo brasileiro, tão carente de formação política e dependente das migalhas populistas, portanto acredito fundamental rever o passado, para entender o presente e talvez alterar o futuro.

Toda a parafernália jurídica que enfeita o processo político eleitoral brasileiro, oriunda da enviesada construção da “Constituição Cidadã” trouxeram, na verdade, um emaranhado confuso de regras que exaltam e referendam um sistema comprovadamente viciado para estabelecer uma infinidade de incoerências que inviabilizam qualquer possibilidade de renovação no plantel parlamentino.

Trocando em miúdos, trata-se de um jogo cujas regras são adequadas, a cada partida, para sacramentar o ou os interesses daqueles que já estão de posse do poder, uma infinidade de regras em branco, que instrumentaliza as lacunas deixadas, provavelmente de propósito, legitimando os concursos conforme a autopreservação recomenda.

As vacâncias jurídicas decorrentes desse complexo, talvez tendencioso, processo eleitoral dá vazão à astúcia, muitas vezes inchada por suplementos financeiros.

Nada tenho, que fique claro, contra a astúcia na política, até admiro, mas tenho tudo contra a astúcia no processo eleitoral e certamente em eleições, isso torna a concorrência desleal e repugnante, para não dizer criminosa.

A resultante desse complicado e ininteligível processo, chamado eleitoral, vem trazendo chagas doloridas na vida dos brasileiros, transformando a principal característica de uma democracia em piadas, gerando descrédito aos principais interessados, os eleitores.

Os arranjos e desarranjos patrocinados pelas felpudas, aparentemente consagrados pelos usos e costumes, permitem impiedosamente que parlamentares jubilem nas Casas Legislativas sem nada produzir, sem ao menos parlarem. Uma verdadeira fábrica de zumbis ou almas penadas eleitorais que perambulam pelos corredores e ambientes, assombrando, incomodando e espreitando vantagens pessoais, com direito a assento, tanto à direita quanto à esquerda.

Anos a fio namorando o poder, nada acrescentam, nada produzem, mas infelizmente são reeleitos às custas dos arranjos e desarranjos ou da astúcia eleitoreira.

Alheios a tudo, por imposição, se encontram os eleitores, os cidadãos que incapacitados ou impossibilitados legalmente não possuem instrumentos eficazes para a correição, já que o remédio somente é ministrado pelos próprios pares, num claro jogo de corporativismo, cansativo, demorado, sempre tendente a se tornar inócuo.

A saga é contínua, talvez permanente. Não existe espaço para arrependimento, aqueles que outorgaram os mandatos são habilmente conduzidos a uma inércia retumbante, sem legitimidade, sem nem mesmo o poder de indignar-se. São facilmente dissuadidos de qualquer tentativa de fiscalizar ou mesmo acompanhar o trabalho dos mandatários, num malabarismo jurídico administrativo que culmina em política, ao bel prazer das felpudas.

A cura constitucional são as urnas, a cada quatro anos, onde todo o processo, toda a astúcia e todo o malabarismo se reinicia, sem máculas, sem óbices e sem vergonha.

Tudo ocorre dentro da normalidade e da legalidade, afinal, integra o pacote ofertado pela Carta de 88 sob nossos auspícios, nossos pacíficos, passivos e bem-intencionados auspícios.

Paz e Luz.

Obs. Ainda deu tempo para registrar a grotesca e dantesca absolvição de um Parlamentar, réu confesso nas chamadas “rachadinhas”, pelo Egrégio Conselho de Ética da Câmara dos Deputados em Brasília.

Durma-se com um barulho desses.

Sobre o autor: Marcius Túlio é Coronel da Polícia Militar de Minas Gerais e analista político

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